AS LUTAS E AS ORGANIZAÇÕES OPERÁRIAS
Nos primeiros anos do século XX as lutas operárias se
concentraram em grande parte pela reivindicação da jornada de 8 horas e pela melhoria das
condições de trabalho. Este foi o caso da greve dos trabalhadores em pedreiras
ocorrida em 1901, no Rio de Janeiro, os grevistas conseguiram reduzir a jornada
de 12 para 10 horas, no mesmo ano são registradas greves em São Paulo dos
tecelões, sapateiros e vidreiros. A luta
pela jornada de 8 horas, se intensifica em 1903 com greves generalizadas em
Recife, Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo, Juiz de Fora entre outros
lugares. Em algumas dessas greves os trabalhadores conseguiram reduzir a
jornada para nove e meia e até nove horas, o que não deixava de ser uma grande
conquista para a época.
A luta dos trabalhadores e trabalhadoras prossegue e se
amplia nos anos seguintes. Em 1906, trabalhadores reunidos no Rio de Janeiro,
sob a bandeira da jornada de 8 horas, realizam o primeiro Congresso Operário do
Brasil e fundam a Confederação Operária Brasileira (COB), no qual foi
preponderante a influência do sindicalismo revolucionário, que a partir de então,
exercerá forte influência sobre uma parcela do movimento operário no Rio de
Janeiro e São Paulo até o início dos anos 1920. O jornal A Voz do Trabalhador,
passa a ser seu órgão de divulgação da COB entre os trabalhadores. Em 1907,
eclode uma série de greves pela jornada de 8 horas, como resposta ao apelo do
congresso nacional feito no ano anterior. Em São Paulo foi um movimento em
cadeia começando pelos trabalhadores em veículos e prosseguindo com os
pedreiros, canteiros, pintores, marmoristas, trabalhadores da limpeza pública,
encanadores, tipógrafos, funileiros, chapeleiros, metalúrgicos, tecelões,
trabalhadores em madeira, trabalhadores em passamanarias (tecidos trabalhados
com fios) e trabalhadores em massa. Algumas
categorias obtiveram êxito e conquistaram a jornada de 8 horas, outras,
conseguiram a redução, mas não para 8 horas. Como é previsível de se supor, a
resposta patronal e das autoridades também não tardou a se intensificar. Em
1907 foi aprovada a lei de autoria do deputado Adolfo Gordo que permitia a
extradição de trabalhadores estrangeiros considerados “agitadores” ou
“subversivos” no meio operário.
De 1910
a 1920 as lutas e a organização dos trabalhadores
continuam se intensificando. Em 1913
a COB realiza seu segundo congresso com 117 delegados
representando 52 sindicatos. A entidade volta a reativar A Voz do Trabalhador
que passa a ter uma tiragem de quatro mil exemplares. Em 1915 em São Paulo é
criado o Comitê de Defesa Proletária, que visa organizar e unificar as lutas
dos trabalhadores. Nos anos de 1915 e 1916 são registradas 144 greves em São
Paulo.
Em 1917, no mesmo ano da Revolução Russa, ocorre em São
Paulo, a mais famosa greve da classe trabalhadora dessa primeira fase de
industrialização: A Greve de 1917.
A paralisação começou no Cotonifício Crespi, localizado
no Bairro da Moóca e uma das maiores unidades fabris da capital paulista. Os
grevistas reivindicavam 20% de aumento, regulamentação do trabalho feminino e
abolição das multas. Rapidamente a greve se espalha pelas fábricas dos bairros
vizinhos chegando a atingir 54 fábricas com aproximadamente 20 mil
trabalhadores em greve. Alarmadas com a dimensão do movimento as autoridades
ordenaram que a cidade fosse fortemente patrulhada pelas tropas de infantaria
que foram orientadas para dissolver as aglomerações. No dia 9 de julho o
enfrentamento entre policiais e grevistas nas ruas de São Paulo resultou na
morte do sapateiro José Ineguez Martinez de 21 anos vítima de um disparo
desferido por um policial em frente à fábrica de tecidos Mariangela no Bairro
do Brás.
A notícia da morte do jovem trabalhador espalha-se
rapidamente pela cidade e produz um efeito incendiário sobre o movimento
grevista. O velório e o enterro da vítima se transformou numa grande
mobilização de repúdio a violência policial usada contra os grevistas. Na manhã fria e chuvosa do 11 de julho de
1917 uma enorme concentração popular estimada em 10 mil pessoas se formou em
frente ao número 91 da Rua Caetano Pinto, no bairro do Brás -a mesma rua da
sede da CUT. Por volta das oito horas e trinta minutos um imenso cortejo
fúnebre pôs-se em movimento. A comissão de frente, formada por um grupo de
mulheres, carregava bandeiras vermelhas e o estandarte do Centro Libertário de
São Paulo.
No dia seguinte, a cidade praticamente parou com a adesão
à greve geral de padeiros, leiteiros e trabalhadores da Companhia de Gás e da
Light. A cidade amanheceu sem gás, sem pão, sem leite, sem luz e sem
transporte. Estima-se em cem mil o número de trabalhadores que cruzaram os
braços na semana de 9 a
16 de julho. Os paulistanos jamais tinham vivenciado um movimento social dessa
magnitude na história da cidade. A Greve se encerrou no dia 16 de julho depois
de três assembléias com milhares de trabalhadores coordenadas pelos líderes do
Comitê de Defesa Proletária, nos bairros do Brás, Lapa e Ipiranga. Além dos 20%
de aumento, os empregadores e autoridades acordaram com os trabalhadores os
seguintes pontos: respeitar o direito de associação dos operários; não
dispensar nenhum operário por motivo de greve e efetuar o pagamento dos
salários na primeira quinzena a seguir ao mês vencido.
O movimento operário mantém seu dinamismo de lutas até
1919. Desta Forma de 1917 a
1919, nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, foram criadas mais
organizações operárias do que em qualquer outro período de tempo
equivalente. A luta pela jornada de 8
horas prossegue com uma greve geral de 60 mil trabalhadores no Rio de Janeiro
no Primeiro de Maio. A partir de 1920 o movimento operário entra numa fase de
refluxo, fruto da intensificação da
repressão e das divisões internas das correntes políticas dentro do
sindicalismo do período. A COB realiza seu terceiro Congresso em 1920 com o
movimento sindical mergulhado em várias disputas internas, ocasionadas em
grande parte pela vitória da Revolução Russa, que enfraquecia a posição dos
militantes anarquistas e anarco-sindicalistas cuja concepção política se
chocava de frente com a concepção de partido e de Estado que triunfou com os
partidários de Lênin. A exemplo do que estava ocorrendo em várias partes do
mundo, após a Revolução Russa, aqui no
Brasil, em 1922, foi fundado o Partido Comunista Brasileiro tendo à sua frente muitos dirigentes que
tinha sua origem política no anarquismo.
Grosso modo, as correntes políticas do sindicalismo
brasileiro dos anos vinte aos anos trinta são as seguintes:
Anarco-sindicalismo: Na visão anarquista toda autoridade é
opressora, incluindo os partidos e o parlamento. Eram radicalmente
anticapitalistas, antiburgueses e anticlericais. Negavam a legitimidade
política do Estado enquanto instituição, independente de classe ou ideologia
política. Privilegiavam a ação direta das massas, através de boicotes,
sabotagens, atentados, greve geral revolucionária. Exerceram forte influência
sobre o movimento operário em São Paulo até os anos 20, mas isso não quer dizer
que tal influência tenha sido generalizado para todo o Brasil.
Reformistas ou amarelos: No movimento operário, durante as
primeiras décadas do século XX, havia um agrupamento de correntes sindicais de
caráter reformista muito heterogêneas entre si, mas que tinham em comum a luta
pela melhoria das condições de vida dos trabalhadores por meio da obtenção de
garantias legais, de um conjunto de direitos sociais, do apelo à intermediação
de representantes do Estado para a solução dos conflitos trabalhistas, da
utilização preferencial das vias institucionais, da não utilização da violência
e do emprego da greve apenas como último recurso. Foram essas correntes
denominadas de “amarelas” que deram vida imediata ao projeto sindical do
governo provisório liderado por Vargas, implantado a partir de 1930. ( ARAÚJO,
1998, p. 202 e 207.)
Comunistas: O objetivo político é a construção do Estado
Socialista através da revolução. O principal instrumento para transformação
social é partido comunista que para eles é o único partido da classe operária.
Os sindicatos são instrumentos importantes de organização da classe operária,
mas devem estar subordinados à linha do partido. Atuam em todos os espaços
considerados importantes para o avanço da organização dos trabalhadores e
adotam estratégias de enfrentamento
combinadas com estratégias legais ocupando espaços institucionais.
O desfecho
conservador desse embate social consolidado com o golpe civil-militar de 1964
impediu que os trabalhadores e os setores democráticos e progressistas da
sociedade tivessem seu esforço recompensado politicamente. A derrota de 1964,
porém, não deve nos induzir a conclusões precipitadas no sentido de minimizar
ou subestimar o esforço empreendido pelos trabalhadores e suas organizações e
nem deixarmos de reconhecer que a agenda de lutas e de reivindicações desses
trabalhadores continua ainda muito atual nos dias de hoje, embora já tenha
transcorrido mais de quarenta anos daquela conjuntura política. Talvez esta
constatação nos dê a devida dimensão do quão foi trágico para a sociedade
brasileira o desfecho daquelas lutas.
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